quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Casa Grande e Senzala em Parati

Sobre o condomínio laranjeiras o escritor pernambucano Miró sapecou bem humorado: É mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que um pobre entrar no condomínio laranjeiras... (*rs!), Isto porque neste fim de ano, quando fomos num feliz grupo de amigos passar uns dias em Ponta Negra fomos humilhados no tal condomínio.
Por alguma razão difícil de entender e impossível de explicar o atracadouro de onde os barqueiros-nativos partem para as paradisíacas praias do sono, antigos e ponta negra, ficou aprisionado dentro do ultra-mega-luxuoso condomínio laranjeiras uma vez que ele se apropriou totalmente da praia empurrando os antigos caiçaras pra dentro da mata. Até aí nada de novo. A novidade fica por conta da inacreditável arrogância que o prepotente condomínio, derrama sobre os simples mortais e/ou turistas que precisam atravessar o condomínio para chegar até o mar para embarcar com víveres ou dirigir-se às praias mais próximas. Chegamos lá por volta das 07h15min da noite no último dia 27 e fomos informados pela guarda que a travessia do condomínio é proibida após as 19:00 horas. Argumentamos que a praia é propriedade da união e que ninguém pode impedir o acesso, desdenharam dizendo que o acesso à praia não está bloqueado e que se quiséssemos mesmo seguir, existe uma trilha pela serra do mar aberta ao público. Algo equivalente como dizer que você pode visitar ilha bela após as 07h00 horas desde que não utilize a balsa, ou seja, você pode voar, nadar ou até alugar um submarino. Neste ponto cumpre esclarecer: Não temos nada contra as pessoas que escolhem como objetivo, a acumulação como suprema realização de vida na sua passagem por este planeta, mas tudo contra o desprezo desabrido que cultivam pelos semelhantes –se é que consideram alguém que não se locomove de helicóptero, um semelhante-, atropelando leis e ofendendo o mais elementar direito de ir e vir. Indignados, não nos restou opção que não fosse pernoitar na vila ao lado onde vivem as pessoas oriundas daquele espaço onde está hoje, o condomínio e que antes eram pescadores e agora são apenas faxineiros nas mansões. Mesmo não sendo religioso, me lembrei de outra parte da bíblia que os cristãos do laranjeiras também se esqueceram de ler: “Aí daqueles que ajuntam casa a casa, reúnem campo a campo, até que não haja mais lugar e ficam como únicos moradores no meio da terra" (Isaias 5:8) No dia seguinte ao acordarmos, fomos informados que existem duas Kombis que fazem o trajeto da Vila-senzala ao atracadouro dentro do condomínio Casa-Grande, das 08h00 da manhã as 07h00 da noite evitando assim que pessoas comuns contaminem as ruas de laranjeiras com suas fétidas patas e visual diverso. Deus do céu exclamamos todos. A Casa grande & Senzala resiste! Não é isso tentou explicar a organizadora das Kombis distribuindo crachás de acesso, o condomínio faz isso sem cobrar nada pra facilitar a vida de vocês (risos!) Foi o cúmulo ver uma caiçara defendendo o condomínio. Disse até que geram emprego, trouxeram luz e progresso à região. Afff! Mas nem todos são catequizados. A grande parte tem plena consciência do jogo bruto por trás das Migalhas. Na volta, foi ainda pior; Um insulto e ofensa a dignidade que nunca tinha presenciado/sofrido. Com o fim do feriado muita gente voltando das praias dos Antigos e Sono, nós que vínhamos de Ponta Negra nos vimos subitamente presos e amontoados com os demais num quadradinho tipo curral demarcados por correntes e acossados por seis guardas e um capitão do mato que vociferava, espumava, bufava e ameaçava veladamente a escumalha a não sair do quadradinho-trapiche-cais, que ironicamente fica em frente ao heliponto onde dormitavam quatro lindos helicópteros . Como as Kombis não conseguiam dar vazão ao fluxo e a plebe enfurecida ameaçava sair andando pelas ruas do condomínio, arranjaram um caminhão e enfiaram todos na carroceria e despachou-os para a senzala digo, a vila onde deixamos os carros estacionados. Como nos recusamos a subir no pau-de-arara improvisado (para facilitar nossas vidas) e nossos ânimos já estavam exaltados, mandaram uma última kombi nos buscar. (sempre para facilitar nossas vidas, não se deve esquecer). Todos nós que ali estávamos e tínhamos deixado os carros na vila-senzala, somos profissionais liberais, pequenos empresários, funcionários públicos, artistas, autônomos, surfistas... enfim simples viventes que estavam apenas interessados na natureza não domesticada ao contrário daquele condomínio pra lá de kitsch, que é um arremedo babaca de tantos outros existentes nas cercanias de Los Angeles. Na verdade, nenhuma estranheza causaríamos ao condomínio a não ser a mania de caminhar ao invés de usar aqueles carrinhos elétricos de golf.
Bem, de volta à vila-senzala, ouvimos dos ex-caiçaras que entre os moradores dali do laranjeiras, estão as famílias mais ricas do Brasil; Industriais, Banqueiros, Barões da Mídia etc... Então, se os dublês de caiçaras e faxineiros estiverem corretos, estão ali os detentores de boa parte do PIB nacional e se esses caras pensam o Brasil da mesma forma que seu condomínio, então estamos todos F...
Ao ver a classe média docilmente se aboletar no pau-de-arara depois de rosnar por quase uma hora dentro do curralzinho, um amigo não se conteve e gritou: “É por causa desse comportamento vira-lata que o Brasil é o que é” e imediatamente o Capitão do Mato ladrou numa tentativa de intimidar: “Me dá o seu crachá, agora!” como se daquilo pudesse advir conseqüências físicas. Foi inescapável imaginar que o cara estava com saudades dos seus tempos de DOI-CODI.
Triste país que tem uma “zelite” que perpetua sem disfarces a mentalidade escravagista, ou seria apenas higienista?

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Ponta Negra


Estive nesses últimos dias com alguns amigos na região de Parati que para mim particularmente é um lugar especial. Ficamos baseados em Ponta Negra que é um lugar inóspito e belo e, ao qual me afeiçoei logo de cara. Trata-se de uma praia inacreditável porque apesar de estar entre Rio e São Paulo, não há um só quiosque ou boteco tocando música no último volume. Tudo muito simples e natural ainda não possui infra-estrutura que atraia as multidões (até quando?). Não há energia elétrica, estradas, carros... Na verdade é uma pacata vila de pescadores que oferecem simples acomodações ou espaço para armar sua barraca e um saboroso peixe espada -no fogão de lenha-, com arroz feijão e salada. Outros itens são por sua conta mesmo em sua mochila, mas nem precisa porque a paisagem, o sossego e a música da natureza complementam. Como é uma baiasinha o mar verdinho é na maior parte do tempo calmo e a poucos minutos da praia há duas cachoeiras deliciosas para revesar. Bacana mesmo é observar a vida preguiçosa dos pescadores que ali vivem. Dão a impressão de que há algo errado com nosso modo de viver tão atarantado e envolto em tantas necessidades... Até as dezenas de cachorros com os quais você divide a praia são largados e felizes em suas brincadeiras inocentes. Para chegar lá é necessário alguma disposição para encarar trilhas e embarcar em pequenos botes dos pescadores num trajeto de uns 30 minutos, que partem do ultra- suntuoso condomínio das laranjeiras onde vivenciei um dos maiores absurdos dos últimos tempos e sobre o qual escreverei um post a parte. Para ver algumas fotos cedidas pela Maria e Silvana, clique aqui. Para conferir no Google Earth, as coordenada são: 23° 20' 50.99" S 44° 36' 24.98" W
Acrescentei fotos do Davilyn que podem ser visualizadas, clicando aqui e do Theo, aqui.