domingo, 9 de outubro de 2016

Tão longe, tão perto...

O João era um cara que foi lá em casa na Luz com aquele cilindro fazer um talharim, mas eu não estava lá. Ele tem um filho com uma amiga, encontrávamos por aí vez por outra, mas raramente falávamos porque eu sempre encontrava com ele saindo do banheiro e eu na fila em algum bar que ele tocava ou então cruzávamos em alguma festa etc... nesses últimos 10 anos. 
João era amicíssimo de quase todos os meus amigos e, portanto muito próximo e sem nenhuma razão não éramos íntimos, mas e daí?  A gente pode gostar de alguém sem ter intimidade? Pode. João era doce e amado por todos e assim lá no fundo eu sabia quem era o João. Infelizmente não dá pra ser intimo de todo mundo nessa vida.
Sexta feira de manhã vi alguém na rede perguntando o que tinha acontecido com o João e eu mesmo perguntei; Que João? E então começou a falação e logo apareceu uma foto do João e a notícia desoladora. Na noite de quinta o João tinha ensaiado com seu irmão (Thiago) na banda em que tocavam e voltaram pra casa cedo, pois o João teria que acordar as 6:00 da manhã e assim antes de chegar em casa passaram na padoca, João pediu suco de laranja e um sanduiche e foram pra casa. Pela manhã, como o João não se levantava apesar do despertador, o Thiago foi acordá-lo, mas o João tinha falecido.
A noticia percorreu minha espinha como um raio: Como alguém saudável com 35 anos se deita para dormir e morre?  Naquela noite não conseguiria dormir direito. Estava aterrorizado com esta possibilidade medonha. Foi uma noite horrível, interminável e modorrenta envolta numa névoa de pensamentos cavernosos, misturados com sono superficial e interrompido com múltiplas interrogações revoltosas e receio de dormir.
Como assim não se pode mais nem dormir em paz? Então saí de casa e fui tomar um whisky barato no buteco pra ver se diminuía aquele aperto no peito e ainda tive que ouvir sandices de tipo: Ah, as vezes quando a pessoa parte é porque ele já tinha cumprido sua missão... Nessa hora sempre tenho vontade de despachar esses infelizes “explicadores do inexplicável-insondável...”
Neste dia o João e eu imediatamente ficamos íntimos. A corrente de tristeza, incredulidade e pasmaceira que se formou entre tantos amigos nos aproximou.
Ainda vai demorar um tempo para sair os resultados da autópsia, mas um legista amigo de bar arriscou um palpite: Isquemia. Algo parecido como quando você está no seu PC trabalhando e num milionésimo de segundo ele apaga sem nenhum aviso prévio. Simplesmente morre. Daí vc checa fonte, memoria, placa e pode descobrir que o hd queimou sem nenhum motivo... de uma hora pra outra já era! Simples assim, desolador.
Para nós que ficamos, é um choque. Nessa hora é inevitável visitar pensamentos evitados e muito difícil aceitar e conviver com essa fragilidade...  Viver a mercê do desconhecido, do inexorável é uma merda e uma crueldade contra a qual ainda nada ou muito pouco podemos fazer.
Às vezes a gente se esquece de que existir/viver é muito parecido com a sensação de estar sempre com um revolver engatilhado na têmpora, empunhado por alguma coisa temperamental e sem compaixão.
Foda!