sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

46 almas, (mais a minha), e o motorista tarado.

Por estes dias, fiquei preso numa cidadezinha por questões supervenientes e recorrentes e aí me bateu aquela fissura de ir embora repentinamente que sempre me acomete e descobri que não havia mais nenhum meio de transporte naquele dia. Nessas horas, tenho a impressão que eu sou o único vivente com sentimento de urgência e necessitado de ir e vir – deve ser por isso que gosto tanto de São Paulo.
Irritado pelo vacilo de esquecer que não estava em São Paulo, propus a um habitante de lá – mediante a pagamento imediato –, que me levasse à rodovia federal mais próxima e me deixasse num posto de gasolina qualquer. Sem entender porquê alguém tem urgência, ele me levou por 80 km de buracos num calorão danado, numa calma infinita, até chegar à localidade de Bom Jesus, às margem da BR364. Foi então que me lembrei de ter viajado por ali de carona em 1979 aproximadamente.
Internamente ri de mim mesmo ao me ver ali sem o menor saco para pedir carona tanto tempo depois. Após algumas tentativas frustradas, avistei um ônibus gigante e enlameado que parou para abastecer e vi que o itinerário era Rio de Janeiro-Ariquemes. Pensei: putz... que tipo de maluco encara uma trajeto destes e porque diabos alguém iria do Rio pra Ariquemes? Este troço deve estar vazio, pensei! Procurei o motorista e disse que precisava sair dali e pagaria pelo próximo trecho fosse o que fosse. Ele me estudou de cima a baixo sem disfarçar e disse: - O carro está lotado! ...mas, o que você faz? De onde vem? Por que está aqui?
Após as explicações ele disse: vamo tomá um café e vê o que nois faiz! Após alguns instantes ele me disse que se eu quisesse poderia ir em pé na frente com ele conversando e teria que pagar por um trecho de 500 km mesmo descendo após 300. Topei na hora.
Foram 4 horas e meia. O cara dirigia com uma só mão a uma velocidade média de 110 km/h, fazia ultrapassagens impensáveis, me dava dicas de sobrevivência nas rodovias, berrava ao celular, ou contava suas estripulias sexuais como motorista de ônibus e, para meu desespero, procurava fotos comprobatórias/pornográficas no maldito celular, para me certificar e detalhar o evento, enquanto aquele ônibus desembestado chafurdava em buracos a uma velocidade suicida e eu pendurado no “puta que pariu” chacoalhando feito um chaveiro. Diante do meu olhar lívido ele me acalmou dizendo: Fica tranqüilo rapaz; eu dirijo neste mesmo trecho há 16 anos e fui até reconhecido pela empresa com o prêmio de melhor do ano três vezes. Não pude deixar de pensar naquelas 46 almas que dormiam atrás de mim além da minha própria, é claro. Então quando se aproximou do local aonde eu iria “apear” ele amistosamente me disse: - Quando te vi com essa mochila, eu sabia que você era uma desses “sombra e água fresca” que andam por aí, por isso te trouxe. Todo mundo que tem uma mochila assim e o pé limpinho, é gente boa. Olha faz o seguinte: Não precisa pagar não. Quando eu parar você me dá uns R$30,00 pro café e mais um cala-boca de R$10,00 para o fiscal. Feito! Já fora do ônibus aterrorizante, fiquei grato aos meus "pés limpinhos" que me salvaram. Eu também presto muita atenção aos pés, mas não exatamente pelo mesmo motivo que aquele motorista maluco.

Um comentário:

Anônimo disse...

Hahaha, muito engraçado. Só vc pra fazer estas aventuras e encontrar essas figuras.
abs
marcão