quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

A (in)Fidelidade Feminina

Esse artigo foi publicado originalmente no jornal O Tempo mas a chapa esquentou mesmo, foi no sites Vi o Mundo e Mhario Licoln com uma avalanche de contribuições e comentários curiosos!

A fidelidade só faz sentido quando voluntária

Dra. Fátima de Oliveira

A infidelidade masculina tem sido a regra e é moralmente aceitável desde a instituição da monogamia feminina. A infidelidade feminina tem sido condenada e vista como moralmente inaceitável. Homens traem desde sempre e mulheres também, só que num percentual menor e mais em surdina. Para Jean Bernard, em "Da Biologia à Ética - Bioética", "Geneticistas e demógrafos consideram que na Europa Ocidental 5% a 15% das crianças são adulterinas. É um número elevado, mesmo a taxa mais baixa (5%). Os dados biológicos modernos não cessam de se aliar às questões de interesse, sórdidas ou não, os orgulhos feridos, os amores paternais, maternais e filiais tragicamente contrariados".

Acompanho regularmente pesquisas sobre infidelidade feminina para entender de que modo o patriarcado é afetado pelas mudanças operadas no comportamento feminino a partir do advento da anticoncepção hormonal, que impôs um novo padrão de exercício da sexualidade ao promover a cisão entre sexualidade e procriação: a visão da sexualidade com fins lúdicos. O marco das pesquisas do que conhecemos por sexologia é o pós Segunda Guerra Mundial: pesquisas de A. C. Kinsey, W. B. Pomeroy e C. E. Martin que resultaram no Relatório Kinsey sobre sexualidade masculina (1948) e feminina (1953); estudos de William H. Masters e Virgínia E. Johnson (1966 e 1970) e o Relatório Hite (1980 e 1990).

A intensificação de pesquisas sobre infidelidade feminina ocorreu paralelamente à identificação da paternidade via teste de DNA, a segunda grande derrota histórica das mulheres (a primeira foi a reversão do direito materno), pois lhes retira o poder absoluto de determinar quem é filho de quem. Desde sempre as mulheres sabem de quem são mães. Os pais só descobriram sua participação na geração da descendência há pouco tempo e a paternidade ficava na dependência da indicação da mulher. Eles eram obrigados a confiar. Certeza de paternidade (99%) só quem pode lhes assegurar é o teste de DNA, novidade disponível na década de 1980.

"Mulheres infiéis: Pesquisas mostram por que elas estão traindo mais e como identificar sinais de infidelidade" é a chamada de capa da "IstoÉ" nº 2.037 (19.11), que no sumário destaca: "capa - Traição feminina: mulheres assumem que estão traindo mais. E o ambiente de trabalho é o mais propício para escapadas". Na página 68, sob a denominação de comportamento, o título é: "Elas estão traindo mais", matéria de Rodrigo Cardoso e Carina Rabelo, com dados de cinco pesquisas que demonstram que as mulheres estão traindo mais ou confessando mais que traem.

Mais que o conteúdo, em cinco páginas, as chamadas diferentes, para um mesmo tema, impressionam! Talvez o assunto seja moralmente tão grave que um único título seria insuficiente para levar à conclusão de que urge ensinar aos homens os sinais da infidelidade feminina. Fiquei irada!

Há muito mais nos dados da suposta crescente infidelidade feminina: o contrato social de fidelidade entre os cônjuges é fácil de ser quebrado porque caduca quando um deles se interessa por outra pessoa. É uma lei da natureza humana que precisa ser lida com franqueza e não sob os olhares de uma moral arcaica e decadente. A fidelidade só faz sentido quando voluntária. A moral hodierna, ainda estribada em uma cultura patriarcal, faz de conta que não entende que a obrigatoriedade de ser fiel nos relacionamentos afetivo-sexuais é uma violência quando não mais se deseja aquela pessoa, ou somente aquela pessoa!

Dra. Fatima Oliveira é médica, escritora, ativista social e uma das 52 brasileiras indicadas ao Nobel da Paz 2005. Autora de 8 livros e inúmeros artigos publicados. fatimaoliveira@ig.com.br

Um comentário:

Indra disse...

E de novo com esse tema! A infedelidade feminina está crescendo, porque os homens e as mulheres não estão mais se atourando um ao outro. São raros os casais que GOSTAM de estar juntos, casais que curtem as piadas um do outro, casais que simplesmente estão se divertindo nesta vida! Uma pena...